1ª LEITURA – Sf 2,3; 3,12-13
O profeta Sofonias se situa no início do reinado de Josias (a partir de 639). O povo está sob o domínio assírio, mas a Babilônia já mostra seu poderio e se aproxima para destruir Jerusalém e deportar as elites do poder e os nobres da corte. Quase todos os três capítulos do seu pequeno livro giram em torno de uma denúncia veemente dos desmandos, corrupções e idolatria dos poderosos, pois a situação política e social é caótica. Muita exploração dos grandes sobre os pequenos e humildes, por isso o profeta anuncia a cólera, o castigo do Senhor para as classes dirigentes e poderosas, para os sacerdotes e adoradores de ídolos. Vai ser um dia de muita calamidade e amargura. Nosso texto de hoje, ao contrário, é selecionado. É o v. 3 do capítulo segundo e o capítulo terceiro a partir do v. 12. É só nestes trechos que o profeta muda o discurso, passando de ameaças e maldições para bênçãos e promessas de salvação. E estas são dirigidas aos humildes do povo com um apelo de conversão e vivência dos mandamentos do Senhor. É só na conversão que haverá salvação. Os ricos não têm mais as bênçãos de Deus. A riqueza, agora, é vista como exploração dos pobres, causa de injustiças e opressão. A espiritualidade da pobreza alcança um grande valor a partir de Sofonias. Os ricos e nobres serão exilados. Os pobres são visto como o resto de Israel. Eles receberão as bênçãos do Senhor e colocarão nele suas esperanças. Entre eles não haverá iniquidades nem mentiras. “Serão apascentados e repousarão, e ninguém (mais) os molestará”.
2ª LEITURA: 1Cor 1,26-31
Vimos no domingo anterior como estava a situação da Comunidade de Corinto, cheio de divisões internas, de vários grupos sem harmonia, muita discórdia, inveja e ciúmes. Paulo vai insistir na unidade em torno de Jesus Cristo, o único que deu a vida derramando o seu sangue para a salvação de todos. No texto de hoje, Paulo lembra que a Comunidade é constituída de pessoas simples, pobres e muitos escravos. Não há nobres e poderosos nem sábios e intelectuais. Na verdade, a preferência de Deus é para os humildes e simples. Deus escolheu o que o mundo considera estúpido para confundir os sábios. Deus escolheu o que o mundo considera como fraco para confundir os fortes. Deus escolheu os desprezados pelo mundo, os que parecem que não servem para nada, para mostrar a inutilidade dos que se consideram importantes. Paulo quer mostrar que ninguém tem motivo de glória pessoal. Quem quiser se gloriar, glorie-se no Senhor. É só Jesus que é sabedoria, justiça, santificação e libertação.
EVANGELHO – Mt 5,1-12ª
Estamos no início do grande “Sermão da Montanha” (Mt 5-7). Para quem Jesus fala? Para multidões numerosas vindas de vários lugares (cf. 4,25). E essas multidões são compostas de gente simples, pobres, aflitos, perseguidos, famintos. Jesus sobe a montanha e se assenta. A montanha lembra o Sinai, onde Deus tinha feito, através de Moisés, aliança com seu povo. Assentado, Jesus assume o papel de Mestre e legislador da Nova Aliança, numa aproximação muito grande com seus discípulos. No Sinai, a distância era grande entre Deus e o povo.
Aqui, o clima é de total confiança e aproximação. Inclusive, aqui, não há leis, há sim propostas de felicidade. Jesus proclama seus ouvintes um povo feliz, bem-aventurado e lhes promete as alegrias do Reino.
Duas bem-aventuranças (a 1ª e a 8ª) sintetizam as outras. A 1ª é: “Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos céus” (v. 3) A 8ª é: “Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos céus”. As outras Bem-aventuranças não são mais do que esclarecimento dessas duas. A promessa da 1ª e da 8ª é a mesma e é uma constatação diferente: O Reino dos céus é deles (verbo no presente). As outras trazem uma promessa futura (verbo no futuro).
1ª Bem-aventurança – “Pobres” são os injustiçados que depositaram sua confiança em Deus. São considerados pobres em espírito, porque estão abertos para participar do projeto de Deus, que é a construção da nova sociedade, baseada na justiça e na igualdade – isso é o Reino de Deus.
A 8ª Bem-aventurança – Tem muito a ver com a primeira, pois os que são perseguidos por causa da justiça são os mesmos pobres em espírito. Eles buscam uma sociedade alternativa através da partilha e da solidariedade, através da luta pela justiça e melhores condições de vida para todos. Isto, porém, não é tolerado pela sociedade estabelecida, que, sentindo-se ameaçada, parte para a perseguição.
Qual é a situação dos pobres?
A 2ª, a 3ª e a 4ª bem-aventuranças vão explicar a 1ª e a 8ª; vão dizer quem são os pobres. A 2ª diz quem são os mansos, os que foram amansados pelos poderosos que até lhes caçaram os direitos; mas eles herdarão a terra. A 3ª diz quem são os aflitos – pessoas cativas e aprisionadas vítimas da sociedade cruel e opressora, mas Deus os consolará, libertando-os. A 4ª diz quem são os que têm fome e sede de justiça – aqueles que não podem viver (fome e sede) na atual injustiça. Eles lutam pela sobrevivência. Sua luta é justa e eles serão saciados. Os pobres são, portanto, os mansos, os aflitos, os que têm fome e sede de justiça. Sua situação é de extrema miséria, injustiça e opressão.
Qual é a meta dos pobres?
As bem-aventuranças 5ª, a 6ª e a 7ª vão mostrar que os pobres querem construir a nova sociedade. A 5ª afirma que os pobres são misericordiosos, são solidários, eles querem colocar tudo em comum. Deus reparte com quem reparte. A 6ª afirma que os puros de coração verão a Deus. O coração é a sede das opções profundas. Os pobres são puros de coração, ou seja, suas opções estão em sintonia com o Reino, são íntegros, honestos com os outros. A 7ª diz respeito aos que promovem a paz. Paz (Shalom) é a plenitude dos bens, é exclusão da injustiça, da opressão e da violação dos direitos. Paz aqui é mais social do que pessoal. Serão chamados filhos de Deus os que lutam pelo bem comum, pelo bem estar de todos.
O conflito na comunidade – 9ª bem-aventurança.
Esta última bem-aventurança é diferente das outras. Ela é mais desenvolvida. Enquanto as outras são escritas na 3ª pessoa, esta está na 2ª pessoa com recomendações diretas aos discípulos. No fundo, ela quer revelar as tensões e conflitos enfrentados pela Comunidade do evangelista. A Comunidade sofria injúrias, perseguições e calúnias, por causa de Cristo. O Evangelista busca em Jesus uma força e um incentivo na caminhada. O v.12, de fato, afirma; “Alegrai-vos e exultai, porque é grande a vossa recompensa nos céus. Pois foi deste modo que perseguiram os profetas que vieram antes de vós.
Dom Emanuel Messias de Oliveira
Bispo diocesano de Caratinga