Diocese de Caratinga

Rádio Eclesia

1º Domingo da Quaresma

09/03/2025 . Comentários Homiléticos

1ª Leitura – Dt 26,4-10

Estamos diante do “credo histórico de Israel”. É um trecho de fundamental importância para o povo de Deus. Este trecho é trazido à memória a cada ano, quando as famílias celebram o memorial de sua libertação. Os vv. 1-3 estão explicando o que deve ser feito logo que o povo tomar posse da terra prometida. O povo deve pegar os primeiros frutos da terra e apresentá-los a Javé, ou seja, cada família devia ir até o sacerdote, levando o cesto e professar a sua fé. O v. 4 mostra o sacerdote pegando o cesto das primícias, ou seja, dos primeiros frutos da terra, e colocando-o diante do altar do Senhor. Depois disso, o ofertante recita a profissão de fé e se prostra diante do Senhor (vv. 5-10). Então, temos aqui todo o ritual com a oferta, a profissão de fé, a adoração e, ainda, no v. 11, o grande banquete de confraternização. Com a família participavam também o levita e o imigrante, que vive no meio do povo. Todos se alegravam com a fé no Deus libertador.

Temos neste gesto dois grandes significados: primeiro, lembrava que o processo da libertação e a posse da terra são ao mesmo tempo dom de Deus que liberta, e conquista do povo que luta e se organiza.

Segundo, nesta profissão de fé, relembrando a ação de Deus na caminhada histórica do povo, o israelita reconhecia a opção preferencial, que o Senhor havia feito pelos oprimidos e marginalizados, pois esta era a situação de Israel no Egito, mas o Senhor ouve o clamor do povo e o liberta dando-lhe uma terra, onde corre leite e mel.

Terceiro: o povo manifesta a sua fé através da gratidão da oferta, onde reconhece que tudo vem de Deus, ou seja, a liberdade, a vida e os produtos da terra. Este gesto de oferta com o final festivo estimulava à partilha e à generosidade. Simbolizava a possibilidade de uma sociedade alternativa, superando a tentação da ganância e do acúmulo.

2ª Leitura – Rm 10,8-13

O capítulo 10 fala da infidelidade culpável de Israel, pois ele não se sujeitou à justiça de Deus em Jesus Cristo, mas quis estabelecer a própria, baseada nos seus próprios méritos de um fiel cumprimento da Lei. O v. 4 diz que Cristo é o próprio fim da Lei “como meta, como termo e como realização”, quer dizer, o objetivo da Lei é chegar até Jesus e Jesus põe fim à Lei, pois agora a vida é encontrada em Jesus Cristo e não na Lei. Assim os vv. 5-13 mostram que o único caminho da salvação está na fé em Cristo. O próprio texto de Paulo faz duas citações. A primeira é tirada de Lv 18,5 onde fala que a Lei plenamente cumprida leva à salvação. O acento aqui está no agir humano. Mas na realidade ninguém é capaz de cumpri-la por causa da força do pecado. A segunda é tirada de Dt 30,11-14 que sublinha o agir de Deus. Mostra que a Palavra de Deus não está distante do homem (no céu ou nos abismos), mas foi colocada por Deus ao seu alcance. No v.8 Paulo mostra que esta Palavra colocada ao alcance do homem não é palavra da lei, mas a palavra da fé. Qual é o conteúdo dessa fé? É o v. 9 que nos traz o sintético e primitivo credo cristológico: “Se, pois, com tua boca confessares que Jesus é o Senhor e, no teu coração, creres que Deus o ressuscitou dos mortos, serás salvo”. Aqui, está afirmada a divindade de Jesus (“Senhor” era o título de Deus no Primeiro Testamento) e a sua ressurreição de entre os mortos. Estes são os dois conteúdos básicos da fé. Para se obter a salvação é preciso confessar ou professar estas duas verdades de fé. Como confessá-las? É com uma confissão externa, pública, litúrgica (através da boca). É uma adesão interior – crer com o coração. Como o coração para o judeu é a sede das opções da vida, crer com o coração significa não um sentimentalismo religioso, mas pôr em prática o projeto libertador de Jesus, onde ninguém fica excluído, pois não há mais distinção entre judeu e grego, pois o Senhor Jesus dá atenção a todos aqueles que invocam o seu nome, ou seja, a sua pessoa.

Em síntese, a vida cristã, ou seja, a salvação trazida por Jesus se recebe numa vida ativa na busca da justiça, honestidade e solidariedade com os mais pobres (= acreditar com o coração) e na proclamação e celebração litúrgica desta vida de fé (= confessar com a boca).

Evangelho – Lc 4,1-13

Os sinóticos querem mostrar, antecipadamente, a vitória de Jesus sobre o poder do mal e, assim, sintetizam todas as tentações, que Jesus sofreu em sua vida pública, nestas três tentações simbólicas. Jesus está no deserto e é guiado pelo Espírito. O deserto pode simbolizar o povo de Israel; o demônio simboliza todos os obstáculos e anteprojetos, com os quais Jesus se deparou e venceu para levar à frente seu programa libertador. Os 40 dias simbolizam o tempo da vida de Jesus – uma geração. Lembra o tempo em que Moisés passou no Sinai (Ex 34,28), o tempo em que Elias permaneceu no Horeb (1Rs 19,8) e o tempo em que Israel passou pelo deserto, tentado a retornar para a escravidão do Egito. Jesus, novo Moisés, e para Lucas, principalmente, novo Elias, vai refazer de modo vitorioso a caminhada do povo com um novo projeto de libertação.

  • Jesus é tentado a ser o Messias da abundância transformando pedras em pão.

Num mundo de famintos, Jesus teria pleno sucesso. Jesus responde com o texto de Dt 8,3: “Não só de pão vive o ser humano”. O projeto de Jesus vai além do alimento. Em Jo 6,15, depois da multiplicação dos pães, o povo quer aclamar Jesus como rei, e Jesus foge.

  • Jesus é tentado a ser o Messias do poder.

O demônio propõe a Jesus dar-lhe todos os reinos do mundo com toda a glória, contanto que Jesus o adore. A tentação é capaz de inverter e perverter o que há de mais sagrado. O demônio quer que Jesus o adore, ou seja, se submeta a ele. A proposta aqui é muito tentadora, pois o povo estava preparado e queria exatamente um Messias temporal, poderoso politicamente. Jesus sabe que um messianismo temporal e político não seria libertador, seria opressor como foi o projeto do faraó, por isso, Jesus responde de novo com Dt 6,13: “Temerás o Senhor teu Deus, a ele servirás e só por seu nome jurarás”. Adorar a alguém ou algo que não é Deus é voltar à condição de oprimido.

  • Jesus é tentado a ser o Messias do prestígio

A segunda tentação de Mateus, Lucas coloca como terceira para terminar em Jerusalém, onde a paixão representa a última e a mais cruel das tentações de Cristo (cf. Lc 22,3-53). A tentação do prestígio é usar o poder de Deus em seu próprio favor, isto é, a fim de se livrar da morte. Dentro do simbolismo da terceira tentação, Jesus é convidado a pular do pináculo do Templo, pois conforme o Sl 91,11-12 os anjos de Deus o protegeriam e o livrariam da morte. Mas Jesus entendeu bem que o projeto de Deus, que é a libertação dos oprimidos, tinha de passar pelo sofrimento e morte, e Jesus não se acovardou. A reposta de Jesus é tirada de Dt 6,16: “Não tenteis o Senhor vosso Deus”. “Tentar a Deus” no Primeiro Testamento significa “desobedecer-lhe, para ver até onde chega a sua paciência, ou, como aqui, recorrer à sua bondade como objetivo interesseiro”. O v. 13 afirma que o demônio voltará no momento oportuno. Isto vai acontecer, quando Jesus tiver que enfrentar os chefes dos sacerdotes, doutores da Lei e anciãos, que representavam o poder (cap. 20, cf. 22, 3-53).

Dom Emanuel Messias de Oliveira
Bispo Emérito da Diocese de Caratinga

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